A
democracia tem as costas largas e à conta de ser usada e invocada à boca cheia,
seja para se queixar à TVI, aos gritos, que já está há duas horas na urgência,
seja para imprecar contra a falta da pena de morte para o “rei gob” ( devia era
ser capado, esfregado com mel e atirado às formigas, vivo!), seja na boca de
gente que tem da democracia a ideia que é um direito democrático ignorar as
escolhas democráticas em urna, quando os resultados não são a seu contento, o
certo é que, hoje, a boa da democracia é sapato que serve em todo o pé.
A esquerda em particular, não sei se para atirar poeira
para os olhos incautos, se por pura burrice ou amnésia ideológica, é a campeã
proclamada da democracia, embora aquilo a que chamam democracia mais pareça um
aleijão, tão aleijão que consegue, em nome da sua, também auto-proclamada
superioridade moral, ignorar os princípios mais básicos, os fundamentos da
própria democracia, o primado da maioria, a aceitação pela minoria da vontade
expressa em urna, o princípio de uma pessoa, um voto, a representação sem votos
de qualidade ou esclarecidos.
Excepto a social-democracia, de que infelizmente, não há
representantes em Portugal, toda a demais esquerda provém de uma base
ideológica para a qual a democracia parlamentar e eleições livres, ao impedirem
o exercício do direito histórico de domínio de uma classe sobre todas as
outras, são “farsas eleitorais burguesas”.
É esta esquerda malsã que, apoiada por um português e meio
em cada dez, mais uma vez em nome da democracia, se acha no direito de pedir a
queda do governo que o povo elegeu livremente e que continua a apoiar, dizem as sondagens, apesar das medidas que o castigam.
Ai da democracia, quando assim manobrada pela vontade
“iluminada” de tais intérpretes!
E, porque a analogia é por demais evidente, não posso
deixar de pensar nesse texto fundamental e “maldito” do cristianismo, aquilo a
que hoje se poderia chamar “Cristianismo essencial, para Totós”, o célebre
Sermão da Montanha (Mateus, cap.5-7).
Este é,
simultaneamente, uma súmula ideológica precisa, dita na primeira pessoa, pelo próprio
fundador ( o próprio Deus, segundo a crença proclamada pelos seguidores), daquilo
que deveria ser o cristianismo e também, por outro lado, a antítese daquilo em
que esse mesmo cristianismo se tornou, até hoje.
Alguém, logo a seguir, tratou de pôr o cristianismo na
“gaveta” (Santo Agostinho, S. Tomás de Aquino) e moldar a “maldita coisa” a seu
jeito e foi para expurgar a Igreja dos “heréticos” seguidores do Sermão da
Montanha que se fez a Santa Inquisição.
Do mesmo modo, ardem hoje nas fogueiras da santa inquisição
do politicamente correcto, da “democracia” formatada à esquerda, todos aqueles
que têm o supremo atrevimento de lembrar ao orgulho dessas elites intelectuais
que se acham democratas e de esquerda e que odeiam esse cheirinho a povo
rasteiro e ignorante que são os resultados eleitorais, que esse é o aroma da
Democracia.