segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Da Queda dos Impérios

Os impérios têm duas vidas. E logo, duas mortes!

Se nos compêndios virá sempre a data em que algum decreto, batalha ou referendo lhes pôs fim, o certo é que um império cai quando morre no coração daqueles que o viveram e acreditaram.

Tive a raríssima sorte, para mais em tempos difíceis de ditadura, de ter tido uma formação ético-política marcante e fortíssima, logo nos anos do fim da infância e início da adolescência.
Num país cinzento e miserável, encontrei no meu caminho um mentor inesquecível, alguém que acreditou que um puto de 11 ou 12 anos seria capaz de pensar pela sua cabeça: O Padre José da Felicidade Alves, pároco da minha freguesia, Santa Maria de Belém.
. Há gente assim, que nos forma e marca de tal maneira, que nos ensina a ser e a pensar, que é como se fôramos seus filhos: no meu caso foi o padre Felicidade e, anos mais tarde, o saudosíssimo professor de Filosofia do Liceu D.João de Castro, o Dr. Rôxo.

Em 1967-68 eu era convictamente comunista! Conhecia outros miúdos como eu que tinham sonhos românticos e heróicos com maoísmos, trotzkismos e utopias albanesas, mas eu era dos "puros e duros": Soviético, pró-russo, aquilo a que hoje se chamaria um "PC" ortodoxo mas que eu vivia como um sonho libertário e generoso.
Mesmo no Maio de 68, quando as coisas se exaltaram em Paris e contagiaram a juventude de todo o mundo, soube manter o distanciamento kremliniano às barricadas.

A quem me confrontava com os factos incómodos, eu contrapunha que era a propaganda imperialista e mostrava as maravilhas que já se desenhavam com Dubceck e a sua Primavera de Praga!
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O Império Vermelho vivia no meu coração!

A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas desapareceu por decreto de Gorbatchov a 31 de Dezembro de 1991. Assim dizem os compêndios, que não mentem.

Mas para mim, o Império Vermelho dos meus sonhos, o que vivia dentro de mim e que era o mais importante, morreu de repente, a 21 de Agosto de 1968, quando numa traição inimaginável para a minha inocente generosidade, os tanques do Pacto de Varsóvia entraram na Praga de Dubceck.
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Chorei de raiva e de impotência atónita, mais ainda ao perceber que o "meu" partido, afinal, também ele atraiçoava o partido "irmão" de Alexander Dubceck, tudo a ruir nesse ano que veria em Dezembro o afastamento do Padre Felicidade da paróquia de Belém, que antecedeu a sua prisão pela PIDE e excomunhão em 1970.

.Treze anos é muito cedo para compreender as verdades por detrás dos sonhos!

.O Partido Comunista Português ficou, para mim, manchado para sempre com essa indelével nódoa da traição. E como é sabido, há nódoas que nem o benzovaque tira...
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Luís Pontes

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